O Marco Temporal e a colônia contemporânea: O Brasil voltando às trevas da história


Por André Luis – Jornalista e Radialista

No dia 15 de dezembro, assistimos ao Congresso Nacional transformar-se em cúmplice de um ato que remete aos tempos mais sombrios da nossa história. A derrubada do veto presidencial ao projeto de lei do Marco Temporal (PL 490/07) não é apenas uma negação dos direitos indígenas, mas uma ressurreição da mentalidade colonialista, um passo para trás que nos leva diretamente ao período em que terras eram tomadas e direitos eram ignorados.

O Marco Temporal, agora abraçado pela Lei 14.701/23, é uma perversão legal que, mesmo rotulado como inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), foi reabilitado por um grupo de legisladores que parece ansiar por uma era em que os direitos indígenas eram meramente ignorados.

A imposição de uma data-limite, 5 de outubro de 1988, para demarcação de terras indígenas é uma afronta à luta pelos direitos humanos e um retrocesso aos dias em que o país era permeado por uma mentalidade colonialista. Ignorar a evolução global em reconhecer e reparar as injustiças históricas é não apenas míope, mas também uma adesão descarada ao legado da colonização.

A manutenção da possibilidade de direcionar terras indígenas para outras destinações é uma reencenação moderna da tomada de terras pelos colonizadores. Isso não é progresso; é um retorno ao tempo em que as terras eram exploradas sem piedade, sem levar em consideração os direitos das comunidades originárias.

A falta de proibição para ampliar terras indígenas já demarcadas é um sinal claro de que a preservação ambiental e o respeito às tradições estão sendo sacrificados em prol de interesses econômicos imediatos. As regras sobre contato com indígenas isolados são um eco da mentalidade colonialista, que via as comunidades indígenas como obstáculos a serem superados, não como culturas a serem preservadas.

A permissão para instalar bases militares sem consulta às comunidades indígenas é um deboche à autonomia e dignidade desses povos, um paralelo moderno à ocupação militar das terras indígenas que caracterizou a era colonial. A desculpa de que isso não se sobrepõe ao “interesse da política de defesa e soberania nacional” é uma tentativa lamentável de justificar uma violação flagrante dos direitos fundamentais.

A possibilidade de realizar atividades econômicas nas terras indígenas por não indígenas contratados é um eco das práticas coloniais, onde as terras eram exploradas em benefício próprio, sem levar em consideração os direitos e interesses das comunidades locais.

Ao considerar benfeitorias realizadas por ocupantes até a conclusão do procedimento de demarcação, mesmo em casos de ocupação ilegal, estamos dando um salvo-conduto à colonização moderna. A indenização, sujeita a avaliação do órgão federal competente, é uma formalidade que mascara a realidade: uma autorização para a ocupação ilegal e a destruição do patrimônio indígena.

Num momento em que o mundo busca corrigir as injustiças históricas, o Brasil parece determinado a reviver os erros do passado. O Marco Temporal é mais do que uma mancha em nossa história; é um reflexo da persistência de mentalidades coloniais que deveríamos ter superado há muito tempo. O povo brasileiro precisa rejeitar veementemente essa regressão, pois a verdadeira grandeza de uma nação está em aprender com seu passado, não em repeti-lo.

 

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